“Vencer este desafio vai exigir do PT um renascimento, uma retomada de valores de nossas origens, entre os quais a ideia fundadora da construção de uma nova sociedade”
A oposição e seus veículos de comunicação empenham-se em disputar os rumos da política econômica, tentando impor um programa alternativo ao que foi escolhido pelo povo brasileiro nas urnas. Ao mesmo tempo, investem contra a Petrobrás, não com o fito de combater a corrupção – como os governos Lula e Dilma sempre fizeram. Mas com o objetivo de fragilizar a empresa e, assim, de um só golpe, aniquilar com a política de conteúdo nacional, de afastar a Petrobrás da condição de operadora única do pré-sal e de fazer regredir o regime de partilha para o regime de concessão. E, em última instância, forçar a privatização da empresa, como tentaram fazê-lo durante o governo FHC.
Eis porque nossa primeira tarefa é defender o governo da presidenta Dilma. Governo em disputa, é nosso dever dar sustentação ao cumprimento do programa de governo, bem como responder aos ataques desferidos contra ela, além de nos contrapormos às pressões conservadoras, dentro e fora do Congresso Nacional. Fazê-lo requer resolver a contradição entre o desejo de mudanças manifestado pela população nas últimas eleições, e a correlação de forças desfavorável presente nas instituições do Estado. Em todas elas, não apenas no “governo de coalizão”, multipartidário e policlassista, ou no Congresso Nacional, agora mais conservador que antes.
Para além, portanto, das alianças partidárias e da necessária sustentação do governo Dilma, é vital ampliar a governabilidade meramente institucional e estendê-la à sociedade, levando às ruas a defesa do programa vencedor, organizando a população para defender o nosso projeto e a lutar por reformas estruturais.
Vencer este desafio vai exigir do PT um renascimento, uma retomada de valores de nossas origens, entre os quais a ideia fundadora da construção de uma nova sociedade. Nosso V Congresso, em junho próximo, deverá promover este reencontro, nos marcos do País de hoje — guardadas as diferenças conjunturais — com o PT dos anos 80, quando nos constituímos num partido com vocação de poder e transformação da sociedade – e não num partido do “melhorismo”.
Toda renovação implica vencer resistências, obstáculos, interesses em choque. Por isso propusemos, em uma das etapas do V Congresso, realizar conferências abertas, a fim de recolher contribuições, críticas e novas energias de fora.
O PT não pode encerrar-se em si mesmo, numa rigidez conservadora que dificulta o acolhimento de novos filiados, ou de novos apoiadores que não necessariamente aderem às formas de organização partidária. Queremos um partido que pratique a política no quotidiano, presente na vida do povo, de suas agruras e vicissitudes, e não somente que sai a campo a cada dois anos, quando se realizam as eleições.
A propósito, vale aqui relembrar um trecho do histórico Manifesto de Fundação do Partido dos Trabalhadores:
“Queremos a política como atividade própria das massas, que desejam participar, legal e legitimamente, de todas as decisões da sociedade. O PT quer atuar não apenas no momento das eleições, mas, principalmente, no dia-a-dia de todos os trabalhadores, pois só assim será possível construir uma nova forma de democracia, cujas raízes estejam nas organizações de base da sociedade e cujas decisões sejam tomadas pelas maiorias”.
Tal retomada há de ser conduzida pela política e não pela via administrativa. Ela impõe mudanças organizativas, formativas, de atitudes e culturais, necessárias para reatar com movimentos sociais, juventude, intelectuais, organizações da sociedade – todos inicialmente representados em nossas instâncias e hoje alheios, indiferentes ou, até, hostis em virtude de alguns erros políticos cometidos nesta trajetória de quase 35 anos.
Dar mais organicidade ao PT, maior consistência política e ideológica às direções e militantes de base, combater os sinais de burocratização, afastar o pragmatismo exagerado, reforçar os valores da ética na política, não dar trégua ao “cretinismo” parlamentar – tudo isso é condição para atingir nossos objetivos intermediários e estratégicos.
Evidente que, neste percurso, é necessário atualizarmos nosso programa, nosso conhecimento e compreensão da sociedade brasileira, do seu estágio atual, das classes sociais e forças em presença, da situação da economia, do cenário internacional. Sem o que fica impossível traduzir propostas gerais em uma política efetiva. Portanto, a questão que se coloca para nós é como fazer valer as mudanças que propomos numa situação concreta, historicamente determinada.
Quando falo da urgência em estender nossas preocupações a uma leitura abrangente e profunda da realidade é porque a concentração quase exclusiva da atividade partidária na disputa político-eleitoral-institucional acarretou um duplo desvio. Primeiro, abriu um imenso vazio teórico, de análise, reflexões e iniciativas sobre o que vem acontecendo no Brasil e no mundo. Segundo, porque a conquista de votos não tem se misturado à luta de massas, de tal sorte que se possam criar condições de construir uma força política organizada e estável, um verdadeiro bloco histórico capaz de inverter a correlação desfavorável na sociedade e de impulsionar mudanças estruturais.
Esse é o desafio colocado para o nosso 5º. Congresso. Convido todos e todas a participarem ativamente das diversas etapas desse processo, municipal, estadual, etapas livres e do Ciclo de Debates da Fundação Perseu Abramo.
Ao contrário de certos arautos de um hipócrita neo-salvacionismo nacional, nós não precisaremos jamais reescrever nossa história. Até porque se alguém pensasse em cometer esta insanidade, jamais conseguiria escrever uma história tão linda e vibrante quanto a que fizemos, a que fazemos e a que continuaremos a fazer. Não iremos jamais negar ou nos envergonhar de nossa trajetória de lutas. Não iremos jamais menosprezar nosso legado ou perder a compreensão do nosso papel histórico.
Mas, como já disse antes, isso não nos impede de reconhecer que cada novo desafio e cada nova configuração histórica impõem novas atitudes, exigem novas ideias e cobram novas formas de combate. É por sabermos disso, e não temermos desafios, que estas filhas e estes filhos teus não fugirão jamais da luta. Venham os desafios de onde vierem. Cheguem as provocações de onde chegarem. Somos feitos daquela matéria indestrutível e mutante das revoluções, porque nos alimentamos do calor e da energia da força popular. Somos ao mesmo tempo iguais e diferentes, porque somos incomparáveis construtores de futuro! E quem constrói o futuro nunca será refém do passado.
Nosso sonho é imortal e imbatível porque é um sonho sonhado pelas massas. É um sonho sonhado por um povo que sofre, porém que sabe cada vez mais sorrir, mais cantar, mais lutar e, sobretudo, mais acreditar que outro mundo é possível. É um povo que olha para o lado e vê a presença solidária de companheiros dispostos a lutar por um país cada vez melhor. Que olha para o céu e vê uma estrela que ilumina e aponta novos caminhos. Uma estrela radiante, que é um sinal permanente de paz, daquela paz gloriosa que é forjada na luta.
Rui Falcão é presidente nacional do PT
Fonte: Portal PT Nacional