O vice-presidente do Parlamento do Mercosul, deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR), afirmou nesta quarta-feira (4/7) em Brasília que uma eventual exclusão da Venezuela do Mercosul interessaria aos Estados Unidos. Dr. Rosinha fez críticas tanto à postura de senadores brasileiros quanto às reações do presidente venezuelano Hugo Chávez.
“Provocada de forma irresponsável pela direita brasileira, a atual crise com a Venezuela foi superdimensionada por Chávez”, avalia Dr. Rosinha. “A não adesão da Venezuela ao Mercosul, além de prejudicar o processo de integração sul-americana, interessa aos Estados Unidos.”
Dr. Rosinha classifica como “desprovido de inteligência” o discurso de partidos como o PSDB e o DEM (ex-PFL). Senadores de ambos os partidos se manifestaram contra a entrada da Venezuela no Mercosul. “Até a Fiesp quer [a entrada do país vizinho no bloco]”, constata o vice-presidente do Parlamento do Mercosul.
O presidente venezuelano afirmou ontem (3/7) que seu país poderá retirar a solicitação de ingresso no Mercosul se, num período de três meses, o processo de adesão não for concluído. “Já se passou um ano desde nós firmamos o protocolo de adesão, e não existe nenhuma razão ideológica, política, econômica ou de outra índole que nos impeça de fazer parte do Mercosul”, afirmou Hugo Chávez.
Em 4 de julho de 2006, os presidentes de todos os países do Mercosul assinaram o protocolo de ingresso da Venezuela no bloco.
Para que o país se torne um membro pleno, falta apenas a ratificação dos congressos brasileiro e paraguaio. Os legislativos da Argentina, do Uruguai e da própria Venezuela já aprovaram o ingresso do país. “Mas vale observar que nem mesmo os venezuelanos depositaram de forma oficial esta sua decisão na secretaria do Mercosul”, revela Dr. Rosinha.
“Um eventual afastamento da Venezuela em relação ao Mercosul faria o país vizinho buscar estreitar suas relações com países como o Irã.”
Tramitação atrasada
O deputado Dr. Rosinha explica que o protocolo de adesão da Venezuela ainda não foi aprovado pelo Congresso brasileiro em razão de problemas de ordem burocrática.
O Ministério de Relações Exteriores enviou o protocolo ao Congresso apenas no último mês de março. Desde então, a matéria está parada. Motivo: o fato de a Comissão Parlamentar do Mercosul ter sido extinta pelo protocolo do Parlamento do Mercosul, criado em dezembro do ano passado.
“Estamos aguardando a aprovação, pelo Senado, de uma resolução que irá criar uma comissão para substituir a antiga Comissão do Mercosul”, afirma Dr. Rosinha. “Vou trabalhar para que o ingresso da Venezuela seja aprovado o mais rápido possível.”
“Ditador” que “mata”
A assessoria de Dr. Rosinha fez um levantamento a respeito da sessão do Senado realizada no último dia 30 de maio, quando foi aprovado o polêmico requerimento sobre a emissora RCTV, cuja concessão não foi renovada pelo governo venezuelano. O requerimento “apela” pela manutenção do funcionamento da rede privada.
A palavra “ditador” foi pronunciada nada menos que 14 vezes —relacionada ao presidente Hugo Chávez—, por diferentes senadores, durante a aprovação do requerimento.
“[Chávez] jogou a polícia na rua para matar estudante, prendeu juízes da Corte Suprema e se proclamou ditador absoluto da Venezuela”, discursou Gerson Camata (PMDB–ES). “Esse país [Venezuela] integrar o Mercosul é uma excrescência”, sentenciou Almeida Lima (PMDB-SE). “A democracia daquele país irmão, lamentavelmente, está sendo ultrajado por um populista ditador”, afirmou César Borges (PFL–BA).
O levantamento foi feito a partir das notas taquigráficas da sessão, publicadas pelo “Diário do Senado” em sua edição de 31 de maio.
“Muitos dos que tentam classificar Chávez como um ditador sustentaram o regime militar no Brasil”, rebate Dr. Rosinha. “E não têm moral para falar em liberdade de expressão, algo que jamais defenderam. Nenhum país sul-americano teve tantas eleições nos últimos anos quanto a Venezuela, e com observadores internacionais que atestaram sua legitimidade.”
Gestor do “valerioduto”
O autor do requerimento que motivou Chávez a classificar o Senado brasileiro como “papagaio dos EUA” é Eduardo Azeredo (PSDB-MG). “Nós fizemos um apelo pela democracia e a liberdade de imprensa, mas o presidente Chávez respondeu com agressões”, defende-se Azeredo em sua página na internet. “Ora, mas quem agrediu primeiro?”, questiona Dr. Rosinha.
Na sessão do dia 31 de maio, o senador tucano comparou a RCTV com a TV Globo. “O fechamento [da RCTV] não se deu por motivo legal, mas por motivo político”, discursou Azeredo. “O que aconteceu na Venezuela foi uma decisão política de não renovar a concessão dessa televisão, que, para melhor entendimento, corresponde à TV Globo daqui, do ponto de vista de audiência, de tempo, de existência. Seria o mesmo que o governo atual fechar a TV Globo por motivo político.”
A declaração do gestor do “valerioduto” motivou o jornalista Luiz Carlos Azenha a publicar, em seu blog, o texto intitulado “Senadores aliados de Bush fazem qualquer coisa para aparecer na Globo”. “Uma crise entre o Brasil e a Venezuela e a conseqüente implosão do Mercosul é tudo o que interessa à Casa Branca neste momento”, escreve Azenha. “Os americanos, como se sabe, sonham em detonar o Mercosul e reabilitar a Alca.”
Eduardo Azeredo convive com a perspectiva iminente de se tornar réu em mais uma ação no STF. O tucano será denunciado no Supremo pelo procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza.
Investigações da Polícia Federal já confirmaram que, em 1998, na disputa pelo governo de Minas, a campanha de Azeredo recebeu pelo menos R$ 11 milhões de repasses ilegais. Parte das verbas teve origem em órgãos públicos do governo mineiro. “Azeredo, como se sabe, é um dos inventores do mensalão, mas neste caso ele serve porque faz o jogo que a mídia golpista quer”, conclui Luiz Carlos Azenha.
Relações comerciais e PIB
Entre janeiro e maio deste ano, as exportações do Brasil para a Venezuela cresceram 31% em relação ao mesmo período de 2006. No ano passado, as empresas nacionais venderam US$ 3,6 bilhões aos venezuelanos —60% a mais do que em 2005.
Desse total, mais de US$ 3,2 bilhões correspondem a produtos industrializados. O superávit do Brasil com a Venezuela totalizou US$ 2,97 bilhões em 2006.
Após o ingresso definitivo da Venezuela, o PIB do Mercosul ultrapassará a marca de US$ 1 trilhão. Saltará de 54% para 76% da economia da América Latina. Rica em reservas de petróleo e gás natural, a Venezuela, com 26 milhões de habitantes, tem um PIB equivalente a US$ 162 bilhões.